não é poesia. não é prosa. não é literatura. não é filosofia. texto. palavra. traço. ponto a linha. entrelinha.
domingo, 28 de abril de 2013
sexta-feira, 26 de abril de 2013
quinta-feira, 25 de abril de 2013
as torres (4 de 6)
Camuflagem do
desvio: Sol a pino árido e seco. Não havia ali mais ninguém quando tornei a me
ver. Isso foi bem antes. Quando pela primeira vez senti que era e tinha dedos.
Foi de uma solidão de crise ver-me saltado destacado e nenhum comum a
misturar-se com meu corpo. Isso foi bem antes.
Agora que começava
a sentir os todos próximos peles e nervuras poros e suores vicejava no caminho
um ralo e estranho mato que naquele solo infértil era sem dúvida impossível de
conceber. E no entanto estavam ali aquelas hastes; relva capim matinho verde a
se espraiar abaixo dos meus passos a refrescar meus olhos.
Aquela cor e mais
textura, aqueles ramos se entrelaçavam a minha frente e me levavam a perder.
Tanto era incrível que ali cresciam que me pus a pesquisar de que modo se
organizavam com que frequência surgiam em que direção mais incidiam.
Era a olhar pelos
lados e rodar o corpo e rir gargalhadas pelo vicejar das folhas linhas abordar
o que quando vi já não era mais estrada nem caminho. Tudo era uma trama de
gramíneas a devolver meus nervos para a superfície e esquecer que vinha pele
passo e corpo cérebro por uma antes estrada.
Não havia mais o
sulco. O leito de terra batida pisado pelos meus pés ao longo de toda aquela
empreitada. Não havia mais nada. Somente eu e uma imensa superfície gramada.
Era o verdejar naquele inexplicável e silencioso e desmesurado ainda deserto.
Mas eu não estava mais na estrada. E vi-me e às torres cordas de um único
viver. Eu era o âmago e me sentia sê-las de um modo que nenhuma palavra é hábil
para descrever.
Nisto surpreendi-me
pedalando uma bicicleta de sete ou treze rodas, inúmeras cordas chaves espelhos
cacos de muitos vidrilhos. Lado a lado vinha aquele antes e vinham outros em
outras embarcações em naves em armações de arame a rodar cada um um par de
pernas os seus próprios pedalares. Éramos uma horda de diferentes aros.
Vínhamos pela frente e pelos lados. E eu quando ri me vi de novo olhando o
espelho daquele um do encontro: era os que o espelho me mostrava mas a risada
me deu o tom de que eu ainda observava.
Será possível que
eu voltara para a estrada?
[continua]
(extraído do livro um mundo outro mundo.)
segunda-feira, 22 de abril de 2013
as torres (3 de 6)
Desde isso muito
aconteceu em diferentes circunstâncias até eu poder ver novamente o chegar às
torres. Tudo porque eu ainda andava por uma estrada.
As torres. O vê-las
não era bastante; o chegar a elas era o que implicava a trajetória. Pareceu-me
simples a alegria plena que senti ao contemplá-las naquele instante. Mas não
foi viva experiência, pois prosseguiu entrecortada. O ver das torres com o pé
na estrada. Vinco de caminho já trilhado não valia quase nada. Apropriar-me do
que vi era impossível, posto que a imagem oscilava. Embora soubesse ser preciso
abandonar o curso que eu seguia, todo e qualquer movimento meu se tornava
equívoco.
Todo o lugar para
onde eu me voltava inaugurava a senda de um destino único. Essa era a miséria
de ainda ter os pés pousados sobre a estrada. Deitei portanto meus passos no
leito seco asfalto já que não havia como deixar de sempre ver com margens o por
onde eu ia. Esse, eu tinha conhecimento, era o principal erro para quem já teve
no horizonte dos olhos o além dos olhos as lâmpadas do além da mente o
pressentir paisagem, abandonar miragem do vago ver. Para quem só de ser o cerne
das torres podia experimentar viver.
Na vinda não
encontrara ninguém até ali que se pudesse identificar como quem vira as torres.
Exceto o da bicicleta, que eu percebera.
Então, longe de
descansar na beira, procurar a sombra, decidi seguir no curso traçado pelos
meus pés ante pés. Julgava alguém mais poder encontrar. Mas dissolver da imagem
se fazia constante cada vez que erguia a face para o fim da estrada. Não via
nada e de não ver vagava vagava. O que só podia enxergar naquele caminho ido
era o meu trafegar pelas bordas precisas que se faziam marcas. Marcas do lembrar
era o as torres não mais poder enxergar.
Mas um dia não
sabido meio acaso, em que a luz do Sol era entrecortada pela sombra de um
prenúncio, deu-me a vista com os poros da toda pele um sentir do vento que
circunda as torres. Vento que me implorava a distância que me erguia o gesto
para o vasto de despojar o corpo no navegar errante. Nesse dia pelas botas
barras de calças e cintura vislumbrei o existir alguém para além da minha
circunstância.
Ver era o assombro
das linhas que surgiam e trafegavam como outras gentes. Ver dois; pôr mais,
surpreender muitos. Inescapados errantes os viandantes eram já tantos os que
emergiam vivos algumas vezes ali na película da neblina da manhã. Era uma
multidão pressentida que ora aparecia ora desaparecia. Mas muitos dos passos
por outros dados ao meu lado eu já podia sentir. Não tocá-los. Senti-los vir
sem chegar a ver.
Camuflagem do
desvio: Sol a pino árido e seco. Não havia ali mais ninguém quando tornei a me
ver. Isso foi bem antes. Quando pela primeira vez senti que era e tinha dedos.
Foi de uma solidão de crise ver-me saltado destacado e nenhum comum a
misturar-se com meu corpo. Isso foi bem antes.
[continua]
(extraído do livro um mundo outro mundo.)
sexta-feira, 19 de abril de 2013
quinta-feira, 18 de abril de 2013
as torres (2 de 6)
...Um que eu
escolhera, foi o que me disse alguém que encontrei num antes de habitar o
instante.
Para cá ele fora
incumbido de trazer todas algumas nem tantas as selecionadas crianças. Seu
método era preciso, ainda que ele se apresentasse de modo risível. Um tipo
absurdo dirigindo um veículo igualmente improvável, que desde muito longe
chacoalhava em um bater de latas.
A primeira vez que
o vi foi o que ouvi que me chamou a atenção. Para lá do que eu seguia vinha
estridente e engonço aquele som. Era algo como uma enorme bicicleta de não sei
quantas rodas. Uma na dianteira sobre a qual ele se sentava e outras tantas
lado a lado paralelas a lhe perseguir. Ele mesmo parecia não compreender o
mecanismo da engenhoca que pilotava. Entretanto conhecia o importante de
arrastar para dentro dela o olhar das crianças que com ela encontravam.
Armação de
espelhos, cacos coloridos que, em lugar de refletir aquele que para eles
olhava, capturavam seu olhar e o sequestrava para seu interior. Isso, ele me
explicou, era o que acontecia com apenas as crianças que eram para ver o que lá
dentro havia. Por esta via ele as deveria conduzir para as vinte e uma torres.
Quando lhe
perguntei por que então o que eu via dentro daqueles cacos era a minha vida em
momentos que eu não antes vivera, ele disse que não sabia nada o que fazer com
adultos que ainda guardavam esses olhos miríades de ver.
Um tanto de tempo
caminhamos lado a lado. Ele na sua bicicleta e eu no meu pequeno passo a passo.
Nenhum se perguntou como aquele acompanhar era-nos possível. Só ríamos do
caminho juntos; o meu, o circuito restrito; o dele, o chacoalhar e os raptos.
Ficamos assim
próximos até eu ver as torres. Foi então que ele me disse que dali eu teria de
vir só até um novo encontro. Antes de seguir foi que lhe perguntei por que eu a
pé e sem ninguém e ele me respondeu a resposta comum desse tipo de encontros.
[continua]
(extraído do livro um mundo outro mundo.)
as torres (1 de 6)
Da estrada já era
possível ver as torres. Naquele contraste de céu e areia amarela, vermelha,
coral e azul, as torres verdes começavam a despontar imensas, ainda que a
milômetros de distância.
Armações em seis,
oito, quatorze, vinte e uma pontas de ferro esverdeado. Não se pareciam com
nada que eu jamais tivesse visto ou haveria de ver em minha vida viva. Seria
miserável compará-las a enormes e brutais eiffels porque elas eram armações que
tinham cerne; não se constituíam como simples emaranhados de ferro. Não eram
trespassáveis pelo vento ou pela areia, embora por elas, através delas, se
pudessem ver as colinas, enormes, que jaziam ao fundo no horizonte, nos
horizontes a toda a volta.
Isso tudo da
estrada, ao chegar, dava para ver. E o chegar era um chegar nunca, pois aquela
lonjura parecia cada vez mais invencível cada passo que se dava pela estrada.
Eu sabia que para alcançar as armações era preciso sair da estrada, abandonar
caminho. Era preciso aportar no nada, na areia líquida do deserto. Única
fronteira onde não há mais cercas, onde não há mais muros, onde não há
distância, porque o lugar é o chegar nele cada vez toda vez como se faz
constante.
Meu dia era ali a
saber que pelo menos as torres eu já conseguira avistar. E eu sabia que isso
alguns já haviam conseguido também. Era aguardar, pois, o momento em que
encontraria algum desses que habitam o já ver das torres da nenhuma distância.
Naquele dia parece que chegara o dia em que eu veria qualquer daqueles uns que
também viam.
Eu não viera a pé o
tempo todo. Ganhara um tanto do caminho ainda precisando de trem. Depois de
mais uns meses de lágrimas e de cavernas, de grutas por onde só escorrem
grotas, finalmente alcançara a fenda porta por trás portal, hélice que se abre
em núcleo, por onde aportam os que se dedicam ao fim de estar chegando. Essa
fenda, não sei muito bem como, eu venci voando.
Após chegar a uma
imensa garganta, vislumbrei um mundo de pessoas habitando. Nas escarpas de
pedra havia uma escada, que eu recusei descer.
Mas vim, continuei
vindo sem ver viv’alma, sem contemplar pessoa; tudo eram pedras, esmigalhar de
dedos pelo cascalho e as fendas que se abrem fundas a engolir os passos
atropelar a vinda.
Agora era ali a
contemplar as torres. Agora era a pé o meu caminho a passo. Um que eu
escolhera, foi o que me disse alguém que encontrei num antes de habitar o
instante.
[continua]
(extraído do livro um mundo outro mundo.)
quarta-feira, 17 de abril de 2013
quinta-feira, 11 de abril de 2013
quarta-feira, 10 de abril de 2013
no deserto
This is the end. Em todos. Porque
navega dentro do sangue o indiscriminado entre o bicho que deixou de ser bicho
e o homem que nem sabe o que é humano.
Em todos em todos em todos: olho do como é que você da quina agulha
meu ser? A criança; as dobras todas do intestino, todas as torções musculares.
Todos os gritos de dor que nem sequer sabemos dar. Estamos todos todos todos
todos, sem exceção, caminhando para o deserto. O deserto. Areias escaldantes
depois de ver o horror.
Paredes quebradas. Ex-janelas. Batentes em ruínas. Parecem grandes
montes de merda empedrada pela avenida. Aberta avenida. Sobre o solo de barro
abrido ao infinito. Agora, as árvores tomam a avenida. Agora os viadutos caídos
mostram o dentro, as entranhas arquitetas, malhas de ferro e aço, redes
afogadas pelo concreto agora ruído. Covas. Corpos.
...Mas o que houve aqui?
Era no deserto. Ninguém sabia quem eu era. Camelo em pé de apalpo.
Cravando cada olho. Espraio-me de priscas eras. (Convés, convém, convivas,
palavras remotas, dentro de mim repetidas.) O resto é o cascalho de areia
quebrada, o solo erguido do que são os edifícios destruídos. Não há mais
navios, não há mais caminhos, há agora areia, cascalho, feita de cacos de
asfalto. E é tudo amarelo e marrom e cinza. E tudo esgueira pela antes rua,
pela agora meda via. Ratos. Ratos. Ratos.
Calpe, culpe, calia, cama, nitrato, vitrina, vitral, vidrilho,
migalha! Tudo é um configurar de trechos sem bordas.
Fronteiras a varar. Roupas penduradas para secar. Roupas soterradas
para secar ao ar. E não há mais ar. Não há mais har.
As névoas, as nesgas já não existem. Tudo é nítido, tudo é um
compelir, impelindo, à aguda percepção. O
que ocultar nesse imenso vazio, no deserto? Estar aqui olhando,
perscrutando tanta atenção: obstinação reflexa que gera as franjas do real.
Vara a mente, vara a íris. Os olhos, ocultos por detrás do cérebro, enxergam
demais. Fabricam infinitos prismas, faces da apreensão; confiscam a realidade.
Enxergam-na por si, esquadrinham-na, sabem como fazê-la. Plenitude extrema da
razão. Cada fagulha de imagem é obtida e transfigurada. A realidade arrasta-me
de encontro a essa nuvem de nitidez, arrancando-me toda centelha do borbulhar
de vísceras.
Nesse silêncio, nesse nada, onde a princípio tudo parece igual,
depois tudo é tão diferente, depois tudo tão complexo e tão absurdamente físico
e, por isso, díspar. Essa presença irrigada pela aridez. Iridescer, luzir da
ausência, e o pensamento na amplitude.
Não tenho nada com que deparar para aplacar essa constância de
pensamento, de percepção. Tudo é tão nítido e claro. E vazio. Ninguém sabe quem
eu sou. Estou andando. O camelo balança meu corpo para a frente e para trás.
Ninguém sabe quem é. Poucos e raros são os momentos em que eu mesmo posso
dar-me à consciência o saber-me eu. Tudo ficou sem sentido. Todos estão andando
como eu. Todos todos todos caminham infinitamente para dentro das areias.
Porque tudo corre por se tornar areia. Um esmigalhar das coisas todas, que
acomete os objetos fabricados. Como um vírus muito potente, na realidade não me
lembro qual. Nem sei mesmo como consigo escrever estas palavras aqui neste
papel. Não sei como consigo encontrá-lo, lembrá-lo. Tudo se perde no instante
seguinte. Todavia, o que não consigo é deixar de perceber, mas, cada vez que
tento trazer sentido para as coisas, elas se desfazem. Perco a linha de
raciocínio. Prendo a atenção, percebo no vazio.
Prédios em lascas. É o que vejo. E esse animal embaixo de mim a
balançar-me num ritmo monótono. E essa crescente consciência da fagulha, das
coisas que se transformam gradativamente, que se dissolvem; melhor, que se
esfarelam milimetricamente, transformando-se cada vez mais em areia.
Eu esqueci quem sou. Eu esqueço. Eu esqueço o que é que essas
pessoas todas estão fazendo indo para o lugar oposto ao lugar para onde o meu
animal parece querer me levar. Não há mais falar. Não consigo entender uma só
palavra do que me dizem. Não consigo pronunciar uma só palavra que faça sentido
para outrem. Muitas vezes tentei dar este texto para outros lerem, mas ninguém
nem sabe o que é que quero quando aponto o dedo para o papel. Olham para o
papel pensando (pensando?) que quero tratar dele. Encostam o dedo nele e esse
gesto todas as vezes produz a degeneração do material. Tantos buracos feitos
que acabei desistindo de mostrar o que escrevo. Assim é também com os panos que
visto. Ninguém pode encostar em mim. Nem eu posso encostar em ninguém. Não nos
podemos tocar ou cheirar, as coisas que nos vestem entram em estado de
decomposição. Assim é com a memória. Esqueço menos quando estou só, a escrever.
Mas não ousei ainda fabular quem sou.
Ir para onde? Sempre me ponho a dizer. Cada vez que pronuncio essa
frase sou olhado com susto. Já passei pelo desespero de querer tocar, mas a
experiência amarga de ver se desvanecerem as vestes de meu interlocutor é mais
assustadora do que a angústia de querer tocar ou dizer. Dizer o quê? Ademais,
não posso exalar em direção a algo ou mesmo a alguém, que desfaço qualquer
arcabouço daquilo ou daquele a quem dirijo meu hálito ou minha voz. Esqueço o
que ia fazer ou dizer, é inútil então prosseguir. Dou graças, sei lá a quê, que
ainda nos possamos olhar. Olhamo-nos mutuamente e a maioria desses olhares se
erige no medo e na dor. Precavidos contra o desvanecer do ser.
Amanhã talvez tenha coragem de reler e ver o que configurei e o que
pude acumular e o sentido que poderei dar a tudo isso. Amanhã.
Não posso vestir outras roupas. Cada vez que toco nos panos ainda
inteiros que encontro pelo caminho os desfaço. De modo que a cada minuto
torno-me mais nu. Na verdade nem sei como estamos vivos ainda, porque a água
que tocamos transforma-se em algo que não sei bem o que seria. É como um dividir-se.
Decompor de átomos a desfazer a água que beberíamos.
O que nos resta, parece, é só
ver. Primeiro foi um transitar de muitas gentes. Aos poucos, nós poucos,
começamos a ver as pessoas a se desfazerem. Não havia aquilo que conheci no
passado como gritos de dor. Não havia desespero no olhar. Parecia um querer se
quebrar no vácuo de cada uma dessas pessoas. Sobramos o quê? Tenho medo de
perguntar, porque isso seria me dizer. Não sei o que comigo pode acontecer.
Espaço.
Ao ler as últimas frases fui acometido de um espaço. Todavia não
terminei. Não me desfiz. A sensação era só o espaço. Ruuuuuuuuu um som do vazio
interno. O que será isso? Não posso pensar, dirigir minha percepção para o que
é meu configurar espaço.
Meu camelo parou de andar.
Parou. Desci dele. Pisei sobre escombros do que sei lá o que era aquilo. Canos,
parecem canos, porque se estão fazendo em pedaços que, pontiagudos, machucam-me
a sola dos pés. Sangra. Líquido vermelho. O sangue escorre e não se desfaz.
Esfrego, então, a palma até rasgá-la e ver sair esse único líquido no qual pude
tocar sem que ele deixasse de sê-lo. Bebo. Alimento. Boca, fel, sensação fel de
nutrimento. Olho para a palma e vejo as linhas do que era. Olho e vejo as
linhas do que sou. O que sou? Nem mesmo a areia desse tempo me roubou a
sensação do que pude sentir que sou. Corpo escorrido de dentro o sangue,
alimento líquido viajando em retorno. Não vazio. Não espaço. Antes cuido que
sou dentro. Carne e líquido. Camadas. É o caso de dizer que sou feito de
avesso. Entre minhas errâncias existem grotas para onde escorrem rios. Sou o
avesso. O outro lado, que se arrasta pelas beiras. Corda roçada, tremida, eu
sou a tripa.
Arremesso-me no abismo, na garganta sem água. A garganta em lança.
Arremesso de faquir que arranca de si somente cacos. Sou o que se consuma, o
que se consuma estilhaço.
Olho, continuo vendo. Olho para minhas mãos e não me desfaço. Digo
algumas palavras em voz alta e pela primeira vez estou só. Não há quem esteja
aqui ao lado que eu não possa tocar. Finalmente estou só. Ainda não sei quem
sou mas já posso ver que estou só. Pude reler, pude reler e ver entre as coisas
todas escritas o eco delas aqui dentro. Sinto-me dentro.
Estrada, agora há uma estrada aberta. Nela não há nem um sinal de
escombros. É uma estrada que conduz a um imenso vazio de sol, cascalho e areia,
areia mesmo, areia havida dos muitos tempos que a fizeram grãos. Espraio-me de
priscas eras. Era o deserto, para onde eu finalmente ia.
(extraído do livro "Babel, é claro" - publicado em 2002.)
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