não é poesia. não é prosa. não é literatura. não é filosofia. texto. palavra. traço. ponto a linha. entrelinha.
sábado, 30 de janeiro de 2016
quinta-feira, 28 de janeiro de 2016
tarde
Já era
muito tarde para dormir. Fica repetindo isto – tarde. Da noite complica o verbo
que nunca se conjuga o começo ou o que se expande. Já era muito tarde para
dormir. E abrir um livro consultar a rede ligar o aparelho de imagens não fazia
mais sentido ali. Já era muito tarde para dormir e mesmo que tentasse vinha
aquele sobreacordar.
Já era
muito tarde muito tarde. Não havia disso fugir. Era ficar sem incorrer em
nenhum atalho. Era sentir aquilo sem ter como fazer para sair. Nada que pudesse
mais servir de escape. Já era tarde não restava mais nem o espelho. O ar estava
frio e nem mesmo o sol se pondo ou levantando dava um fim àquilo de já ser
muito tarde. Muito tarde para dormir. Sem mais o que fazer se não permanecer
acordado. Sem um livro sem rede sem nenhuma outra imagem. Era ver era sentir
arrefecer desguarnecer deixar de ser aquele que ainda poderia dormir mesmo que
já fosse tarde.
Era
olhos. E postura. E o corpo faminto de um gesto sem nada encontrar que pudesse arredá-lo
daquele estado de estátua. Era parado ali. Aquilo tudo passando e nenhum
sentimento de marasmo.
Era já
evidente que por algum caminho se embrenhara. E de lá já não podia sair. Estava
ali num espaço entre o que sejam as possíveis coordenadas. Nem um canto. Nem
circunferência. Nenhuma curva ocupada. Estava líquido passava passava e
passava. E sombra frequência fragílima já podia surpresa ser notada.
Mais
nada. Mais nada. Mais nada enfim.
Acordava.
(extraído do 'livro' "um a um - os poros da paisagem pólen")
quarta-feira, 20 de janeiro de 2016
segunda-feira, 18 de janeiro de 2016
ainda que
para Rodrigo Lucheta
Ainda que eu faça borrado sem palavra escrito de lado. Ainda
que eu faça sem lastro sem tom sem acorde. Ainda que eu faça sussurro rumor do
urro da garganta só o gutúrio. Ainda que eu faça sem nome e sem tônus. Ainda
que eu faça com terror do meu próprio enredo. Ainda que eu faça sem fôlego só
no gesto em espasmo desatino. Ainda que eu faça pequeno arrancado a faca do
desespero. Ainda que faça sozinho naquele quarto naquele abismo o que se traça
do que eu não digo o que escapa o que consigo. Ainda que eu faça no extremo do
que se passa a contrapelo. Ainda que eu faça sem fim. Ainda que eu faça sem
língua que me ultrapassa foge ao meu grito. Ainda que eu faça sem céu sob a
borrasca barco sem leme. Ainda que eu faça aos tateios passos sem passos passos
tropeços. Ainda que eu faça aos soluços o que se esgarça não é o que eu digo é
o que arranco da noite dos dias o que extraio dos pesadelos. Ainda que eu faça
ao abrigo do que insiste em se chamar de íntimo e que não passa da regra engendrada
na pele dos primeiros dias. Ainda que eu faça comprido e não chegue a dizer o
que me percorre a frio. Ainda que o corpo em estase me impeça o gesto me impeça
o grito o vulto a voragem o vórtice a trinca deixo anotados versos interditos
som de traçado letra só atrito. Ainda que eu faça na vaga corpo lançado do
parapeito. Ainda que eu faça sem rima sem frase sintagma num texto suicida.
Ainda que não chegue a nada barco na areia noite perdida sulco esboçado sístole
distímica. Ainda que não alcance a palavra o que se passa não é o que eu digo
mas o que me transborda os poros e rasga meus dígitos. Ainda que eu não fale
mais nada que escorra dessa baba o rastro o visgo do meu corpo a corpo contra
esse Eu desde o início prescrito.
(extraído do 'livro' "afeto confesso")
sábado, 16 de janeiro de 2016
sábado, 9 de janeiro de 2016
pano de coberta
Pano de coberta laranja. Tapete de sala fechada. Cortina
cobrindo até o fim da parede. Sofá com manta jogada. Tudo e a luz do pequeno
abajur acesa. O cinzeiro cheio de pontas e cinzas. O isqueiro sobre a mesa de
centro e no meio dela toda a letra escrita. Encontrar a terra onde eu vivo. O
pedaço de chão que é só meu. Encontrar o minuto que habito. O ritmo dos
compassos e dos avisos. Os números desencontrados daquele dia. A hora perdida
perdida. Encontrar nos trajetos perdidos a respiração de dentro da casa.
Encontrar o que se deu o interdito o que ficou ecoando no corpo o que sumiu
pelo sangue e pelos anos o que se foi sem nunca sair de dentro do peito.
Nenhuma palavra mais dizer sobre isso. Dizer tudo sopro e soprar tudo num sopro
sem frase.
(extraído do 'livro' "afeto confesso")
domingo, 3 de janeiro de 2016
desde aqui
Visitar outro lugar outra quimera.
Esfera de fios outra atmosfera. Visitar das outras sombras do que vai pelo vão
do que escapa das mãos e da respiração e que nem mesmo pulsação se não muito
cuidada jamais poderá pressentir. Visitar o outro lado o caminho contrário o
que não se cogita o que está no pressente no vazar do vazio no que não obstante
o que nenhuma régua o que nenhuma secante.
(extraído do 'livro' "um a um - os poros da paisagem pólen".)
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