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quinta-feira, 20 de setembro de 2012

clark



Eu acordei outro no mesmo lugar, agora eu sou assim. A colcha o brilho da tarde o quarto o tecido que cobre a cama. O comum da manta a calma que me desce ao raio e à sombra que entra pela janela. Eu que sou outro sem direito saber quem fui. Que já não me ajusto em minhas roupas que já de mim não fujo. Eu acordei outro agora em meu lugar eu de verdade esqueci o de onde fui o que onde surjo. Eu acordei assim olhando de perto cada fibra dos meus dedos pousados sobre a colcha e a colcha sobre o travesseiro.
Foi assim: era de alvitre que eu tivesse vindo de outro lugar. Arrumasse o caminho por onde eu ia passar. Era mesmo uma outra pessoa que era. De quem agora eu já nem lembro. Fiquei aqui no meu dia o dia comum a passar o que eu já nem me lembro.
Fechadura e a porta atravessada pelo outro lado. Agora agora uma sala um tapete-sofá uma cadeira e alguém sentado. Era o intruso o que dormia e ocupava esse lado? Era um algures um sem luzes um viver confuso sobre aquele estado. O como um outra pessoa o que não se vê pelas costas. Quando a luz do abajur dá um close num anoitecer de febre.
Eu acordei outro este aqui e quem sabe?
Era de um susto esse que vinha e via areia onde antes não sabe direito o que via. Se é que via. Era um desdia outra esfera. Numa casa difusa um fulgurar de outra era. Era um passando do passar do outro lado do muro era um futuro do outro não estava claro e nem era escuro.
No semblante não havia nem as linhas nem os horizontes tudo era uma concha onde se juntam correntes de muitas águas. Era um ralo que não suga pelo contrário espalha espirra ponto disperso de todas as praias.
E o que se poderia dizer de mim sem os meus óculos. Eu era um Clark sem capa e estava ausente. E no entanto estava ali, por outro lado, de outro modo, de um jeito estranho uma outra maneira de ser gente. Eu nem via ou reconhecia. Era o que cria e que vinha um jeito de inventar divergente. Nem desse mundo nem outro mundo um total estranho do qual nunca se disse ou se viu ou se provou nunca um local do qual se possa dizer um isso ou um isto. Um estar errante por outro lado difícil de crer impossível descrever. Um mundo algum um lugar nenhum zona do nenhum instante cúspide do vácuo abstruso lugar de onde algures já se possa dizer.
Era o vagar vagante.
Você jura?
Com quem falo?
Aqui não há quem possa dizer ou ouvir?
Aqui vai do que aconteceu.
Você viu? Ou caiu? Ou vagou? Ou já foi desse mundo ou de lá cogitou?
Cava cúspide alvo do olvido e do que não dizer. Outro lugar terra nenhuma de que se possa volver.
Você viu? Ou ocupou? Você dali já voltou?
Nem a sombra franja ou fagulha nem o vento ou o vulto nem o lugar nem o minuto.
Você viu ou voltou?
Um trepido burburinho um silêncio descontínuo um lampejo borda do dia um fulgurar turbulento um fraquejo descair um lampejo de meios. Outro lugar nem um algures vasto um mirar sem lá estar um de outro modo ver.
Você viu ou de lá voltou?
Você um outro que habita. Você um outro tão outro que nem direito posso textemunhar o que foi já que outro vou outro encontrar por outros meios.
(extraído do livro um mundo outro mundo.)

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

morada



Noites e não procuro. Sou a solidão traçada pelo pisar de pernas peregrinas. Meus olhos são do escuro. Não ilumino a senda do horizonte. Chegar cheguei a cavalo, mas de verdade os passos foram pisados pelos meus próprios pés. Nenhum encontrei. Estava tudo em tábuas de escuro e úmido. Todos pareciam ter fugido. Ou então estavam dormindo. Ali o silêncio era um entrecortar de respiros. E eu não me ocultava o que não via. Sabia. Sabia.
Preferi o solo e a grama úmida ao mofo de tábuas. Desci os degraus até a frente da casa e armei a coberta ali mesmo diante. Depois que dormi vi que vieram ver-me mas não me acordaram. Revistaram-me o alforje e não me tiraram nada. Deixaram-me o pão do comer todo dia que eu não cheguei a tocar. Meu alimento vinha da seiva do meu respirar.
No claro do dia encontrei muitos olhos. Todos eram de um esculpir-me a história. Nada do que me diziam me abria em grotas. Não era de suas vozes que me apartava. Era do que respiravam era do que queriam com só a ponta feita precisa do seu convencer-me de quem era. Pensei vezes comigo se teria de fugir se sustentaria minha curva naquele desvio. Cogitei de me perder, de encetar descaminho. Mas era tudo o que era para haver, então decidi vir nos elos dos eles e deixá-los me ver.
Entrei caminho por dentro a casa. Cumpri o risco da conversa trocada das palavras desditas das explicações devidas. Varei minha própria via. Fui comum, fui nenhum, fui só um, fui na vaga dos meus erros.
E vi deitarem-me no solo do agora raiz plantada por eles identificada. Deitei mesmo assim deitei e fiquei em silêncio sentindo o que é que aquilo poderia fazer de mim. Embora imóvel no que queriam me ver fiquei ali a olhá-los sem ainda ver o que fazer. Mossa da terra deitada ocupei o vazio da vala. O que cavavam para mim a modo de me conhecer. Fiquei ali engajada em deitar o me dar a ver.
Depois como havia sempre as noites em que se iam o largar-me lá passou a não mais os entreter. E era não ver-me o ali deitada investida do que qualquer forjar pudera querer. Era ali na terra enterrada ali planta plantada para ser destino do que eles me supunham ser. Mas no meio daquele novelo nó de atropelo ralo dos lugares nenhuns verti mais vértices de mim fabriquei outras linhas digitais nos dedos. Fui o completo e o descomeço.
Era daninha. Do eu do meu nó me vi arrancada pelas voltas que eu dera antes de seguir por essa entrada. O que era em mim um antes um agora sempre seria curva modificada. Sempre fazer outra curva outra florada.
Fui o não isso no silêncio. Suprimida respiração desistida espalhei a terra da minha medida. Surpresa infinda ali na cava do lugar que me deram vi que não era nada do que eles eram. Desconfigurar de sombra projetada atravessada por seus olhos ressentidos. Fui varada mas minha seiva invisível me colheu dali numa fuga não almejada.
E brotei novamente meus pés ante pés no caminho vazio de uma noite bem funda uma noite escura uma noite vazia em que no horizonte não havia nenhuma casa habitada.
(extraído do livro uns tantos outros.)

terça-feira, 4 de setembro de 2012

arado



Avançar varar. Arar com as pontas dos pés. Segurar no detrás de um motor ou cavalo segurar no vento e arrastar as pontas dos pés descalços a modo de fazer veios na terra ou na areia ou na água tépida que recobre a areia. Avançar sendo pernas e pés arrastados segurando na rabeira de um motor seja ele um carro um cavalo seja o vento ou o que quer que arraste o corpo de modo tão vórtice que da gente naquele presente só deixe o rastro a lanhada dos pés o estreito de um lastro.

(extraído do livro "um a um - os poros da paisagem pólen".)