não é poesia. não é prosa. não é literatura. não é filosofia. texto. palavra. traço. ponto a linha. entrelinha.
terça-feira, 31 de julho de 2012
s.ó.s.
A
estrela toda a terra. Vir de longe. O sangue que corre ao largo que dentro de
mim se esconde. Imenso do passar da planície do planalto por sobre todos os
montes. Montanhas de neve caldos de pedra areias dunas sementes de argila seca
que migram por toda a Terra o planeta. Poeira que se respira incrustada nas
paredes película nas paredes por dentro nas passadas cansadas na respiração arfada
no sufocar derradeiro soterrar de camada até a cintura.
Estamos
sós. Não há grito que se ouça. Omenires stonehenges pirâmides de egitos terraços
erguidos altar na floresta. Estamos aqui sozinhos. Não há gritar. Não tem por
onde. Nosso dia é um solitário alcançar da colina e de só ver horizontes. Vales
valas planaltos planeta. Milhas alcançadas milhas perpetradas milhas milhas e
só e sempre o que desde longe horizonte. Vales perdidos. Mantras perdidos.
Gritos perdidos.
O que é
que por baixo de tudo isso ainda se esconde?
quarta-feira, 25 de julho de 2012
terça-feira, 24 de julho de 2012
aqui da quina
Tudo o
que pegava se quedava nada. Um desconcerto. Rugas na testa, requebro de cabeça.
Tudo o em que mexia não era, vingava ou existia. Tudo era um desacerto.
Inarredável recomeço. O que sempre ia errado o que sempre não era. Tudo o que
entabulava não se convertia certo. Ralo do lugar nenhum, sulco para onde corria
tudo tudo o que imaginava se convertia um nada. Massa fumaça vapor.
Pó,
faculdade nula, mãos que não capturam. O mundo lhe passava pelas costas e por
mais que se virasse estava sempre de costas. O pó de pólvora por sobre os poros
da pele apelo de chama. E o pensamento a abrigar a pouca voltagem, imagem turva,
sempre voltada ao avesso.
Cérebro
nas mãos. A consciência do infinito prego enfiado entre os miolos. Furo nos
gomos. Aquela interrupção do metal enferrujado impedindo conexões. Cérebro
enfiado nas palmas atentas nas pálpebras alertas angariando o sentido. Cérebro
difuso no parafuso liso acidamente enfiado por entre as por entre as
sobreposições da carne. Nem mente nem margem nem mergulho nem imagem. Cérebro
atravessado pela ponta furo feita pelo enfiar do cilindro agudo prego buraco
aberto e uma interrupção. Farpa da dor da consciência que convém e que arma as
malhas de linhas que se mesclam no que só vara por um parco curto sentido.
Cérebro que não alcança. Implacável seta que não atinge; amontoado de gomos que
trocam as tintas de todas as coisas no parco sentir.
Passo
de cobrinha, rastejar na gosma da dor infinda, gotejar de visgo que fere as
horas. E do eco da lata por onde ribombam os gongos a reverberar pelas camadas
do cérebro passa a ser somente pelos olhos. Escapa da dor pelo lento olhar.
Súbito momento
aturdido relaxa os músculos da vista e apalpa com os olhos na sombra úmida as
ondas que suas pupilas têm de enfrentar à força de o fazer ver.
E o que
é que flagra de suas crateras preenchidas? As imagens que se formam e dizem só
o que ele pode ouvir. O que ele pode ver. O que ele pode então concluir: que
concluir é um caminho de cabras-cegas. Um caminho percorrido a prego enfiado na
cabeça. O que apreende é que só se enxerga quando se cria. O que pelos
corredores deixamos escapar; singularíssima obra que nos amplia e abarca; o que
se desdobra mesmo que vindo do labirinto equívoco que somos, curva única por
onde assoviam os ventos.
(extraído de uns tantos outros.)
segunda-feira, 23 de julho de 2012
sábado, 21 de julho de 2012
quinta-feira, 19 de julho de 2012
deserto
Espaço de mosca. Ver todo mel
ver todo dourado azul do véu do ver seja lá o que pode apreender o olho da
mosca. Espaço de pisar na terra, e sentir pelos pés feitos papilas todo árido
todo tórrido todo sal do amarelo todo o escaldante silêncio da areia do desterro.
O exercício miserável dos mil
dias das mil dunas dos mil horizontes desviados das mil terras dos mil vales
dos mil incomensuráveis espaços.
Era aberto o labirinto por
onde eu deitava meus passos. Era amplo e me digeria os ossos os olhos a fronte
o crânio e o que por dentro dele havia. Era dia e eu sobre a terra uma perna
após a outra a obrigar os pés a cavar o solo. Era aberto mas se fechava em arco
em arestas em inumeráveis vazios que preenchidos pelo não chegar nunca a um
destino abrigo se faziam talhos desses imensos dias.
Atravessar o dia outra noite
outra noite outra noite e assim incontáveis mil que se penduram pelas dunas
ultrapassadas que se enumeram às costas mas que se impõem diante dos olhos como
areias nunca vencidas.
Anotar as horas já é inútil,
os minutos já desde antes caem como fagulhas sem ponta no nenhum imenso nada
que é viver o trocar das pernas nesse atravessar do nada parede enorme que
nunca chega a se configurar.
Labirinto de azuis sem curvas
ou cantos nem léguas a medir desmedindo a via aumentando desmesuradamente a
travessia.
Toda a noite nunca chegava a
noite era sempre o dia. O sol o céu a pino e a cabeça espremida pelo clima.
Todo gesto era transmutado em passo entre o estreito que se alarga no vazio
deflagrado ante os olhos os ossos as carnes e o deslocar de ar que implica o
menor dos movimentos.
Toda voz era o mesmo gesto.
Todo olhar todo grito todo andar todo riso toda lágrima tudo isso era um
configurar de abismos. Abismo era o silêncio que não se consuma. Os dias os
dias e o sangue por dentro as paredes as rodelas miolos e o que lá dentro se
agita. Mar de imagens. Mar de imagens que se nutrem do comum trafegar dos
líquidos por dentro e fora e dentro é fora e dentro e fora a fora o dentro e
erra.
Vagar perigosa entranha.
Roubar do esbarrar a miserável história que se conta que se insere que se
inscreve no cader no pequeno entre folhas no minúsculo das letras espicaçar de
laços deslaços entrelinhar daquilo que vai por dentro e fora no entrechocar da
pele. Superfície clara que esgaravata toda toda toda a matéria a contar de
todos os milenares dias dos milenares corpos das milenares vozes a dizer
convocar encontrar-se entre cada um dos pensamentos que se querem aqui livres
desse arquimiserável destino.
Convém cavar com outra ponta
não os joelhos nem as solas nem as palmas nem quando plantas nem mesmo línguas.
Convém cavar?
Convém afundar?
Convém deslizar?
Convém parar e ficar e ficar e
ficar até vir a sede a fome a dor o medo o caos o onde se dissolve esse só e
solitário sentido.
Não
existe labirinto maior que atravessar.
(extraído do livro onde houver vida a vida haverá de vingar.)
quarta-feira, 18 de julho de 2012
terça-feira, 17 de julho de 2012
segunda-feira, 16 de julho de 2012
nem onde nem quando nem quem
Ouvir todas as
vozes. Desde o mundo. Desde cedo. Desde um vindo. Desde onde ainda não existe.
Respirar todas as eras. Passar pelo que ainda não é caminho. Ver. Ar do ar
arrancar do ser. Mão e tela. Vértebra osso onde tudo começa. Recusar não o
ouvir o nome do ouvir ponto de inflexão: a pessoa do singular. Mais que a
matéria, mais do que ver, passar.
Algo ou ém que
reverbera. Área superfície vértebra. Osso de onde ouço vozes antes da carne
dentro da carne da cadeia do alvoroço. Do alvorecer. Aurora caroço.
Quadro do que é que
vê. Do quem é que vê. Do que é que diz. Do quem é que diz. E o cansaço bagaço o
corpo lasso jogado na praia. O destroço. Barco em pedaços nem mais mastro nem
mais âncora.
Quem estava ali?
Quem estava ali na areia? Quem era que agora ali abria os olhos e via. Sem um
alguém. Sem um destino. Vago avesso. Mãos pés pernas e passos carne da gema sol
a pino.
Era braço ombro e
tórax. Corpo erguido. Era pernas pés e plantas na areia. Era ver areia
escaldar. Um semblante barco se dispersa.
Olhar no espelho
até ver sair a tinta, sair o barro, sair a carne o traço o vinco. Olhou no
espelho até ver sem olhos sem olho sem testa. Olhar e a palma da mão o avesso.
O que se desdobra o que se desprende o que se expressa. O dentro do lado algum
do sem espaço e do sem tempo.
Agora nada verter
ou esperar ou pressentir nada sorver. Não mais atar do ar. Do antes, de dentro,
pescoço goela cordas e sangue. Escadas da traquéia, degrau a degrau, desfazem-se
o ventre e o canal. Gutúrio espargir o que de pouco em pouco entre. Vulto momento.
Espaço
desfazido da cada partícula onda. Espaço agitado pelo vibrar sem cordas. Silêncio:
Extremos são os dias vividos desde o modo aqui.
(extraído do livro um mundo outro mundo.)
sábado, 14 de julho de 2012
sexta-feira, 13 de julho de 2012
céu de Goeldi
Passeio pela calada. Escura entre
postes de lâmpadas acesas e de luzes apagadas. A noite engole as estrelas.
Ainda há pouco, até a bem pouco mesmo,
gastava a vida e os dedos anotando números entre estreitas linhas. Anotava
dados tão precisos que qualquer descuido desembocaria em desastre. Dados que
nada expelem de acaso. Dados contados.
Isso foi há pouco. Até a bem pouco
tempo.
Agora erro na rua e na curva da noite.
Mas já não trago mais nada de mim. Tudo ficou no papel e no rasgo do dedo. Tudo
ficou recortado. Cada uma das coisas retidas naquele papel naquela página.
Naquilo que fiz durante horas durante toda a tarde. Naquele recente passado.
Sento na mesa da calçada. Um copo.
Depois outro. Os vultos vagam sua espessura. Sua espessura esboroada.
(extraído do livro onde houver vida a vida haverá de vingar.)
quinta-feira, 12 de julho de 2012
quarta-feira, 11 de julho de 2012
terça-feira, 10 de julho de 2012
sexta-feira, 6 de julho de 2012
flash!
Ontem mesmo eu estava
sentado na varanda do meu apartamento, quando senti um vento estranho. Aos
poucos fui-me dando conta do quanto não se pode segurar um vento quando ele vem
sobre as nossas coisas. E era uma situação aparentemente simples: eu estava ali
semidespido na varanda. Havia tirado a camisa e jogado sobre a grade. Havia
espalhado sem perceber os cadernos do jornal. De repente, uma rajada forte de
vento arremessou minha camisa para fora e num ato reflexo eu tentei pegá-la.
Quando vi estava com meio corpo pendurado para fora da grade. Olhei para o chão
dali do nono andar. Nunca tive medo de altura em toda a minha vida, mas naquele
instante imprevisto eu senti meu corpo em
vertigem, a possibilidade da queda. Medo. Fisgada de medo que se alojou
no estâmago, digo, ômago. Ômega.
Parado ali, tendo a
altura e o vento a me circunscrever, fiquei em pêndulo de pernas e tronco com a
grade pelo estômago com medo. Instinto rápido, algo em mim moveu o peso interno
do corpo e pude novamente sentir os pés e colocá-los peso sobre o chão. Por
momentos, resgatado do arremesso involuntário, senti um alívio de autocontrole.
Segundos, átimos, depois, senti novamente o vento em meu cabelo, o vento sobre
as folhas do jornal que se desprendia leve do chão e voava à altura da grade da
varanda. Estiquei novamente o corpo sem pensar para agarrar a folha de um
encarte desses com ofertas de supermercado. Antes da grade pude segurá-lo,
porém a essa altura aquilo tudo começou a representar um perigo imenso de atos
reflexos. Catei o que pude e entrei para a sala de estar, fechando a porta de
vidro. Fiquei ali em pé, olhando o vento carregar de um lado para o outro as
folhas do jornal que deixei de catar. Olhando o céu se armar de preto para a
tempestade. Ar de sombra chegando na tarde.
Ali parado em pé, o
estranho era a sensação de vertigem que não havia se desfeito, ainda. Pelo
contrário, antes localizada em frio no estômago, a vertigem parecia ter-se
instalado no coração. Batidas fortes, vendo o vento, que aumentavam,
avolumavam-se em coração. Ataque cardíaco? Idade eu tenho para isso, pensei.
Aumento de um tum-tum que escuro e forte batia duro dentro do peito. Ataque!
Ridículo, não pode ser.
Aquilo era o ver o vento
jogando árvores, assobiando a tempestade, trazendo o escuro para dentro daquela
tarde e talvez a lembrança ainda próxima da altura não calculada encarada há
minutos. Um quase nada que me fazia ali geléia humana, ainda bem que desacompanhado.
Medo da morte. Não que nunca tenha sentido. Mas, assim parado, congelado nos
órgãos, o friozinho do que será, eu nunca tinha sentido. Em seguida a esses
instantes nada se acalmou em mim. Nada. Eu nunca havia me detido a pensar na
morte, em como poderá ser o momento da morte. Naquele instante, trazido por um
arremesso, o pensamento da morte tomou conta de mim. E agora, como é que vai
ser?
O tudo simples, prático
e objetivo que havia vivido até então, desapareceu num minuto diante daquele
vento. A iminência. Em instantes, comecei a imaginar uma catástrofe natural se
aproximando com aquele vento. Imaginei um ciclone arrancando árvores,
arrancando carros do chão, arrancando pessoas da calçada. Ali, passando na rua,
uma senhora arremessada contra o muro do prédio em frente. Placas de luminosos
voando ainda mais leves e desgovernadas que minha camisa ou as folhas do
jornal. Postes de fios balançando, eletrocutando tudo aquilo em que encostam.
Horror do descontrole, do não-seguro, do impossível de se conter.
Inadministração.
Legumes vivos, alvo
exposto: a incomensurabilidade do diminuto.
Negar três vezes de nada
adianta, Pedro, a morte há de vir, e já que virá por que não deixar-se digno
levar em seu momento? Nada, há sempre o antes. Terror premonitório. Todas as
possibilidades. Cada passo que se dá nas ruas. O em pé na plataforma do metrô,
esbarrão, corpo no vão dos trilhos, esmago eletrocutado. Tudo é ataque, cair de
escada, degrau de escada-rolante que come o corpo do caído, rasgo, dilaceração.
Tudo é acidente, imprevisto, impredito, descrever encenar em mente o indizível.
Varandas que desabam, canos de gases que explodem, asfaltos que se abrem em
gretas e levam corpos humanos para o fundo correr do esgoto. Nada escapa, tudo
escorrega, espatifa, espirra, esbarra, esparrama, esvai. Expande explode
escapole extrai. Predição.
Nunca mais tive paz,
depois de ontem à tarde na varanda; em que cheguei mais cedo do trabalho.
(extraído do livro babel, é claro, 2002.)
quarta-feira, 4 de julho de 2012
terça-feira, 3 de julho de 2012
poças no asfalto
Alma
presa na caneca e vou ver o romper do dia. Com a camisa empapada, molhado o
linho branco. Abri a porta da cozinha e olhei para fora. Desci os degraus. À
direita o terreiro de galos. À esquerda o pasto malcuidado. Em frente ainda o
pasto malcuidado e as montanhas. Montanhas azul-marinho e a luz irrompendo ao
final dos olhos, no horizonte. Abordava já a abóbada da Terra a luz clara
esmaecida de um sol cor de prata que nascia para um dia cinza. E o latir de um
cão ao longe. A caneca com o líquido quente e preto feito tinta preta a pintar
papel com a ponta da caneta. O dia nascia e eu ali com a caneca quente de ágata
na mão. Mugido, patas de cavalo ao chão. Migalhas e patos e galinhas se
aproximam da porta da cozinha ao perceber movimento. Eu estava lá. E era plena
manhãzinha o começar do dia era a aurora a aurora era um quase-clarão. Ao final
daquela noite horrível em que tive de admitir para os meus filhos que não tinha
mais de onde tirar o pão. Sair matando gente isso nada dissolveria a situação.
Eu estava ali presa do dia sem nada poder fazer. A fazenda aos pedaços. As
vacas todas a adoecer. As contas. Água que não era mais potável. Água que não
se bebia. Que não se podia mais beber. Eu estava ali com a camisa de linho
empapada de suor ao romper resoluto de mais um dia e era dia a ver o que me
restava era ver o dia nascer.
E não
era isso tudo no fundo falso? E não era mudo esse começo de um dia após uma
noite com todas essas felpas de luminosidade da percepção? Não era tudo escrito
com a tinta da caneca o café preto que da ágata esquentava minha mão? Era tudo
um pouco me lixando para os meus filhos para o pasto para as galinhas para a
pouca de água potável que ainda havia. No fundo do poço eu não tomava um só
gole aflito daquele café. Eu estava era vendo o nascer de um dia que se fazia
nesga de preto e prata no rasgo laminar de um horizonte estalado nas minhas
retinas. E nada de tirar o pão que nem de filhos que nem de leite que nem de
vaca que nem de pasto dei conta não. Era tudo com o único fito de viver fugido
idílio. Isso que da sensação da alma presa na caneca empapada camisa de lindo
linho vinha. Isso de não dar conta, o que no fundo não veio não vindo um movimento
de me fazer. Vala da inundação de dizer para os meus filhos que não tenho de
onde tirar o pão é o que nascia naquele esgar de dia que se erguia. Filhos
aflito eu a dizer e o dia que nasceu depois disso.
Um
misturar de camadas. Desde que eu decidira que iria morar na fazenda. Desde que
eu decidi que ia levar meus filhos comigo. Desde que eu decidira que
abandonaria tudo porque a fazenda ia a todo vapor era só uma questão de manter.
Depois
o desmazelo e a impraticidade. O estar perplexo ante cada complicação. As
visitas ordinárias do veterinário. O leite que não verte. O mato que crepita
bordeja espraia avulta e toma conta de todos os caminhos. A cerca que apodrece.
Os funcionários que não sei o que é que eu sempre digo nunca é o que eles
conseguem ouvir. O não infinito, tudo de quina, tudo tropeço, tudo uma peça
errada no lugar errado no dia errado no gesto errado a falta completa de jeito.
E eu de camisa de linho apoiando os braços agora na cerca. Era fugir dali e
encontrar de novo o asfalto a poça o nunca chegar na água o nunca aportar
seguro. Alma presa na caneca e o líquido que ali havia agora frio, caldo do
denunciar do equívoco.
Eu não
pude ver como foi que cheguei aqui. Eu não pude ver o que foi que me fez
chegar. Eu não pude ver um só minuto o corredor extenso que me trouxe para
isso. Nada aconteceu comigo. Tudo foi devido, porque afinal agora eu vejo era
eu que estava completamente distante do que era preciso. Deflagrar fracasso um
esperar do alvorecer à meia-noite. Uma parede por onde me escoro. O centro
agora é deixar vir toda essa modorra.
O dia
morno irrompendo na retina. Ardia ali aquela prata preta de céu que se fazia e
carregava ainda mais meu senso de peso. Imersão num sentimedo de ver o mundo
sob uma atmosfera escura como se o dia o que me acontece sempre virá bordado de
uma sombra de breu. E aquele céu ardido que se fazia me submergia no mais
profundo ar fechado, canto opaco, tapado. Mas ainda assim não se podia dizer
que não se tratava de um novo dia.
Não
tinha mais como, porém, porque não tinha mais pão. Não arrumava mais nada. Era
guiar o carro pela estrada a carregar as malas e me devolver à cidade, à casa,
às paredes de verdade.
Tudo
foi um delírio deflagrado de um gesto feito olho do que se inscreveu imagem. A
fazenda. Como se o gerúndio do substantivo tivesse me sufocado o gesto. Estava
e sempre esteve ali e o meu fracasso acabara sendo um triunfo o de desfazê-la.
A fazia, mas o gesto era sempre antes, ou fora. Como se numa esteira circulante
o instante preciso fosse sempre perdido. A falta de ritmo. Afasia.
Agora
era entrar no carro, na casa, no martírio do novo dia a dia. En la masmorra.
(extraído do livro uns tantos outros.)
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