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quinta-feira, 26 de abril de 2012

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Atravessar que mar? Atingir o topo de qual montanha? Superar quantas cargas cilícias? Morrer de sífilis quantas vezes?
Viver cego com tremores arrastar a febre a perna e a noite. Ouvir os dentes batendo. Meter-se na miséria intestina de todo e de toda a gente.
Dobrar-se de medo, de diarréia. Sujar as calças. Lavar-se nos canos do meio-fio. Vestir-se com a mesma roupa por anos a fio. Vagar pelo asfalto pelas pedras, cascalho. Desdobrar-se miserável pelas trevas pelos pequenos orifícios do corpo. Tragar as nuvens de fuligem minar os olhos da miséria.
Ser corpo, covarde, matéria. Tremer na tarde nas paredes dos rins nos parênquimas abissais nos órgãos. Curvar-se ante o martírio de seus próprios cheiros fétidos. Mijar nas calças nas sombras nas soleiras. Comer até a tampa destapada. Vergar de fome pela rua dentro da sua própria casca.
Travar a mais oculta batalha. Aquela de que ninguém fala do corpo transformado em dejeto e ainda assim conseguir-se fazer limiar do diverso.
Não encontrar em si a fronteira. Pelo contrário nem o contrário recusar-se de recuar quando se vir sendo a beira. Dobra intestina invaginação do plano. Corpo. Engruvinhamento dos tecidos todos das paredes parênquimas.
Desdobrar-se ao infinito cair cair cair tombar. Aceitar. Arremessar-se no gesto fatal da janela. Do parapeito do próprio peito. Ser à beira da beira ser a própria beira e debruçar-se para fora. Cair de si sair de si engendrar-se para além da carne o que avulta o que vibra no osso e se desinstala. O divino nó da tripa o colosso o abismo que se abisma para dentro e por dentro para antes do gesto.
O que não é avesso o que não é correto. O que não tem preço o que se apraz antes de ser corpo o que se desdobra o que se diz dobra o que se não dobra e ultrapassa a corda do seu próprio gesto.
(extraído do livro "um mundo outro mundo".)

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