Naquele
dia ele veio vago vago vago feito viesse no convés de um navio. Nenhuma sombra
o perseguia embora seu ar fosse esse de prega entre o que dava a ver e o que
efetivamente existia. Nenhum sibilo de montanha o apavorara mais do que saber
que ia ter de descer e andar entre as gentes e experimentar viver no preparo de
comidas, no cuidar de fogões e pagar de contas. Mas ele tinha isso como uma
determinação interna. Ele tinha decidido que ia virar pão. Ele tinha previsto
que isso seria necessário, como fora necessário o dia em que sentiu aquilo vago
vago vago dentro dele e esse sentimento de tudo atravessar e de ser atravessado
por tudo. Agora ele tinha de aprender a viver semente entrementes todo
entrecortar do momento pequeno e o pausar das mãos e o pisar dos pés no azulejo
da cozinha e os dedos que apertam interruptores. Ser cor e corpo diariamente
era o mais difícil intento desde que lhe acometera aquele sentimento de tudo.
Presença do presente na pele na carne na hora vazia. Ele colocou a camisa,
abotoando botão a botão sobre o peito o pano que agora o envolvia. Ele calçou a
meia e vestiu como se vestem os dentros dos sapatos grossos de couro. A
ausência de nervura ou vinco no couro denunciava o pouco caminhar com corpo
feito até agora. Dava pouco a ver o que nele havia.
Ele
tinha sido silêncio até então. E ao mesmo tempo era de extremos. Intensos
extremos, essa é a verdade. E dessa forma deveria permanecer entre os
resfôlegos das horas. Contudo, ele tinha de olhar e deixar vir seja lá o que
fosse. Ele tinha de aprender a passar. Corpo no corpo. Pulsar trazido o
coração. As fibras da carne umedecendo-se no navegar do sangue. O barulho tenso
de sua articulação no pescoço.
E isso
era o filete. O que bania o seu vago para sempre. Agora era corpo mensurado e
vivo. E não mais devia se deixar apartar do que vinha. Navaga de vir vindo
sempre.
E
assim, de pé, escolhendo papéis para guardar nos bolsos das calças, pensou em
quanto corpo além disso poderia experimentar. O que vibra para além da sua
fibra molecular. O que onda havida comunicada cada a cada paralelepípeda
energia a revolutear. O encontrar. E o encontrar de tudo a parede pele
pelímetro que se vira feito página lâmina na mão. E assim com as chaves, dentes
encaixados nas fendas.
E foi
pra rua. Camisa branca na calçada. Sol estridente entre as pálpebras e o vigor
do metal de automóveis. E passo a passo na escala de centímetros inteiros
abordar da porta de onde trabalhava. Entrado, olhado, sentou-se.
E
viram-se os olhos comunicar o veio o vulto do abrido do que dele ido e olhado e
o revido do olhar do outro lado. Camisa branca as axilas lisas deslizar da pele
molhada empapada. Um riso e o desviar dos olhos, mas ele havia prometido isso
não mais fazer. Levantou novamente o rosto e encarou o ainda outro lado e vinha
a voz de um sorriso fresco no ar que recebeu em cheio. Requebrar de cabeça e um
meneio. Cabelos contra a luz da janela e ventam como chama fecham o vidro e o
vento ainda venta. Ar fresco ali, no meio das mesas e quinas e papéis e teclas
repetidas a descer e a subir nas telas pintando, mas isso não mais interessa.
Acometido e olhado retribuído e revidado. Algo em haver, isso sim era descer. E
ver. E veio.
–
Quantos bolsos e papéis você agora traz consigo.
E riu
daquilo ter sido dito.
– É que
agora os trago escritos aqui comigo o que digo.
– E não
trazia antes?
– Antes
eu só ficava pensando em pousar a caneta e nem teclas usava. Agora os tenho
todos avulsos rasuras anotadas.
E olhou
os dedos de unhas cortadas. E ouviram-se seus risos suas gargalhadas.
Naquele
dia o vento estava forte como só em alto-mar podem ser fortes os ventos. Ele
segurava o leme com confiança de vela inflada. E havia ali alguém a pôr a vela
a favor do vento. E o sulco cortava a água cortava a areia por onde o barco
passava.
(extraído do livro uns tantos outros.)
Isso é viver
ResponderExcluirmaria
LINDO!
ResponderExcluirMUDAR É MUDAR DE ATITUDE. É ASSIM QUE ENTENDO,E D FORMA LINDA COMO DESCREVE .
VERA